6.2.12

Escritor clandestino

Estou de luto. Mataram-me as palavras. Não as tenho mais como minhas companheiras de amores impraticáveis, de noites infindáveis. Não estou cansado, tenho novidades, tenho assunto, mas não consigo mais desenhar minha vida nessas letras cheias de hiatos. Acho que não posso mais me intitular escritor, pois, vês, Caio viveu para o amor e passou a vida inteira sofrendo por ele, Clarice conviveu com uma loucura introspectiva tentando encontrar esquina da felicidade com a razão. Desculpe-me a franqueza, palavras, mas não nasci pra ser sofrido, desses tais que traduzem lágrimas em frases, amores em orações... Mas quis sofrer, quis ter amor e ter desamor, quis a felicidade e quis a infelicidade... Quis saber nortear amigos em seus problemas, quis tanto ser pros outros, que eu acabei esquecendo de ser pra mim. E, ser pra mim, me parece um ser tão egoísta que tenho aprendido a gostar. E eu meu ser egoísta não atura meu ser escrevendo, porque escrever é traduzir a alma e meu eu agora andou lendo meus pedaços de alma por aí e me viu tão despedaçado e perdido. De mim. De todos em mim. Por isso, não posso viver aqui clandestinamente, preciso sair por inteiro. Pegar meu visto. Decolar de tudo. De todos. Preciso escrever um fim nessas histórias meladas de tristeza que me fizeram mais feliz nos fugazes 30 segundos depois. Mas eu volto.

3.2.12

Rei de paus

Eu nunca quis ser a artesã de eu vou te esquecer, porque tentar te esquecer é andar na contramão do eu não vou te amar e hoje, meu bem, eu bati feio com o carro. Talvez eu não consiga ser mais a artesã de muitas outras palavras, porque você silenciou minha vontade de traduzir o que não tem tradução. Amor. Eu e minhas mãos estamos quietas. É de minha vontade deixar impressa essa decepção apenas em espaços, não em letras. Juro, estou cheia de casquinhas pelo corpo e mais uma não me fere tanto, e já vejo cicatrizes se formando por aqui. Estou desacreditada nessa besteira de amor, pode ser que exista para você, leitor sortudo, sortuda, amante, contemplada pela reciprocidade. Pra mim não. Por isso, andei muda. Estive magoada, como quem perdeu um jogo importante porque trocou as cartas, confundiu paus com copas. Paus com copas... Mas passou, sabe. Demorou pouquinho. Estou embaralhada. E pronta para jogar de novo. Com novas cartas. Que nunca mais me atreverei chamar de minhas.